Rui Tavares Maluf

PREFEITURA DE SÃO PAULO

A EQUIPE DO PREFEITO FERNANDO HADDAD

Por Rui Tavares Maluf*

Pelas palavras do prefeito eleito Fernando Haddad (49) (PT) o secretariado que ele escolheu para auxiliá-lo a governar São Paulo é uma composição entre técnicos e políticos. Ao fazermos a verificação dos nomes que foram efetivamente confirmados (incluindo as desistências), vemos ser assim mesmo que o processo se desenvolveu e, talvez, com uma ligeira ênfase para o lado técnico. No entanto, reconhecer tal verdade é como não acrescentar nada para uma análise sobre as possibilidades de sucesso da nova administração uma vez que tal separação pode gerar um entendimento e/ou expectativa absolutamente equivocados, pois o técnico costuma ser visto como sendo aquela figura quase imaculada, dotada de um conhecimento especializado e uma carreira sólida que o político não possui e, ainda, capaz de fazer as decisões serem cumpridas devido ao seu próprio saber especializado. Indo além, na linguagem da política o técnico é aquele o qual além de dispor de uma área de atuação profissional bem definida estaria fora das disputas pelos cargos eletivos populares e, talvez, até mesmo das pelejas pelos cargos na estrutura partidária. E o político seria exatamente o que disputa cargos populares, com ou sem êxito regular, e na estrutura partidária, e entendido geralmente como portador de interesses e práticas particularistas.

Qualquer leitor que acompanha com alguma regularidade a vida pública sabe que tal dicotomia raramente ocorre. Técnicos que são alçados a cargos de decisão em primeiro escalão precisam reunir alguns atributos políticos para desempenhar bem seu trabalho por vários motivos dentre os quais elencamos apenas alguns: 1) os cargos são de livre escolha da autoridade eleita popularmente, o que significa ser de confiança desta, a qual, mesmo que estribada no reconhecimento da autoridade eleita de que o escolhido possua um conhecimento específico, ainda assim passa por critérios pessoais e subjetivos; 2) o cargo de confiança, tal como o prefeito, sofre quase invariavelmente pressões políticas, especialmente se a área para a qual o mesmo foi designado é executiva e atuando sobre segmentos sensíveis da sociedade, tais como Transportes, Saúde e Educação. Parte da pressão política pode ser entendida como a que é socialmente convertida em ação política, originando-se de movimentos sociais e/ou de interesse e que são encapados pelos partidos políticos e/ou grupos políticos e/ou pelas casas legislativas; 3) Raramente o indivíduo que deve tomar decisão conta dispõe de apenas uma escolha técnica a ser feita, pois a técnica se trata da aplicação de um ou mais conhecimentos específicos para solucionar determinado problema. Como toda ação tem uma implicação, a decisão política de qualidade é a que procura levar em conta a melhor técnica considerando a condição política existente. Nossa experiência de muitos anos acompanhando a gestão pública tem mostrado muitos insucessos dos técnicos sem tais qualidades que aceitam assumir cargos de confiança em áreas executivas com as características que mencionei. Para além dos motivos arrolados no parágrafo acima, há que se levar em conta outro aspecto que vem se tornando cada vez mais caro à boa gestão, tanto pública quanto privada e objeto de um campo de estudos que se tornou conhecido no Brasil sob a denominação de gestão de pessoas. Não basta saber se a pessoa escolhida para determinada tarefa reúne os predicados necessários para implementá-la, como é o caso de conhecimentos (saber) e habilidades (saber fazer), mas sobretudo desses dois acrescidos da atitudes (como fazer), e, por último, e, praticamente impossível de saber antecipadamente, a entrega (executar o que é demandado). Isso quer dizer, que os melhores políticos contemporâneos em cargos executivos são aqueles que sabem da importância de conjugar bem os requisitos da gestão de pessoas, ou, ao menos, de ser capaz de liderar processos de trabalho que exigem alto envolvimento com a equipe e confiança na delegação de tarefas e de disposição para supervisão das mesmas. Grosso modo, a história recente do Município de São Paulo tem revelado que certas decisões de caráter estratégico são eventualmente bem tomadas, porém, com baixíssimo grau de articulação entre a estrutura intermediária e operacional da Prefeitura, pois os prefeitos e seus secretariados (mesmo quando incluindo os técnicos) apresentam elevada dificuldade para monitorar a implementação de suas decisões e integrá-las nas áreas vitais de execução. Tome-se o caso do prefeito em fim de mandato, Gilberto Kassab. Ainda que ele tenha tomado decisões importantes para a cidade ao longo de um mandato e meio (6 anos) com algumas execuções bem feitas, dando liberdade para seus secretários trabalharem, parece ter falhado neste trabalho de integração e harmonização, falha esta que repercutiu em vários questões relacionadas ao cotidiano da população.

E além das considerações sobre os membros do secretariado do novo prefeito, será tão ou mais importante conhecer a capacidade dos 31 subprefeitos, se é que o número de subprefeituras não venha a aumentar em breve. E nesta matéria, o prefeito parece ter uma compreensão simplista e até mesmo retrógrada ao ter proposto que seus ocupantes sejam engenheiros. Nada contra estes profissionais, mas a Lei Orgânica é absolutamente clara em relação à tais órgãos, ao considera-los tão importantes quanto os secretários. Um subprefeito pode até ser um engenheiro, mas este não deve ser um critério de escolha, nem mesmo uma regra instituída, como não deveria ser o de oficial reformado da Polícia Militar, tão empregado por Gilberto Kassab (PSD). Poucos parecem ter compreendido que a riqueza e contribuição das subprefeituras estaria em que estas viessem a ser em pequena quantidade para que seus titulares pudessem participar da tomada de decisões com prefeito e secretários e cada órgão saberia da conveniência de ter postos avançados que a descentralizassem em função das características demográficas, econômicas e sociais de cada área.

Finalmente, tão ou mais importante do que conhecer a equipe do prefeito Fernando Haddad será conhecermos sua disposição e talento pessoais para enfrentar uma cidade extremamente complexa, a qual pode ganhar muitas coisas com sua trajetória acadêmica, mas também perder muitas outras por estas mesmas características se ele não estiver muito atento para esta nova experiência em sua vida.

*RUI TAVARES MALUF é diretor de Processo & Decisão Consultoria, professor da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, doutor (USP) e mestre (UNICAMP) em ciência política.

Palavras-chaves: Prefeito de São Paulo; Fernando Haddad; Gilberto Kassab; Secretários Municipais; Secretariado; São Paulo; Político; Técnico; Cargo de Confiança